É minha intenção divulgar, através deste meio, as minhas ideias a respeito da sociedade em que vivemos, expressas em todos os livros que escrevi, mais ensaísticos ou mais literários - Luis Valente Rosa.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

A verdade

Aquilo a que chamo procurar a verdade é tentar uma apreciação, ou uma apreensão, absoluta da realidade, em vez de uma apreensão relativa. Pois a relatividade implica que seja parcial, naturalmente distorcida por via do que nos liga a qualquer coisa: pode ser um partido político ou um clube de futebol, como pode ser uma pessoa nossa amiga ou nossa familiar.

Quando existem campanhas eleitorais, por exemplo, a leitura das pessoas sobre os factos é totalmente condicionada (relativizada) pelo partido com que simpatizam. Se, amanhã, o líder do seu partido disser a mesma anormalidade que disse, hoje, o principal concorrente, os comentários e a interpretação serão totalmente diferentes. Ou como no futebol, pois nunca vi um apoiante do clube A defender que houve penalty contra o seu próprio clube e o do clube B argumentar que não houve. Isso nunca acontece. Ou estão os dois de acordo, ou cada um defende o seu clube.

No fundo, a coisa é bastante ridícula se pensarmos que as pessoas não se importam de passar por estúpidas, ou mal educadas (ou ignorantes), só para não dizerem mal dos seus. Ou seja, submetem-se ao ridículo para proteger os seus.

Mas onde eu acho que a coisa se sente mais é com os familiares, sobretudo com os filhos. É verdade que todos nós achamos natural que assim seja. Mas não deixa de ser caricato ver pais a tentarem convencer as outras pessoas de qualidades que os filhos manifestamente não têm. Ou a dizerem que determinada coisa não aconteceu – ou não aconteceu de determinada forma – quando todos sabemos muito bem a verdade.

O problema é as pessoas parecerem não perceber que não ajudam os outros. Pelo contrário, fazem com que, no dia em que o elogio seja merecido, ninguém acredite nele. Por outras palavras: em vez de ajudar, desajudam.

Porém, esta aparente estupidez no comportamento, de facto, não existe. Porque não acho que as pessoas se ridicularizem para defender os outros. Não fazem isso por serem altruístas e quererem proteger os outros. A realidade é completamente diversa.

Como já tentei explicar algures a propósito da cultura, as pessoas fazem-no para se defender a si próprias, para se auto-elogiarem. O que acontece é não quererem reconhecer que as suas características, as suas opções, não são as melhores. O objectivo não é mostrar o valor daquele partido, daquele clube de futebol ou daquele filho. O que importa é valorizar o meu partido, o meu clube, o meu filho. Porque, ao fazê-lo, estou a valorizar-me. Em suma, as pessoas não percebem que os erros dos seus protegidos não são, na maior parte dos casos, desprestigiantes para a sua própria pessoa. Acima de tudo, não percebem que o que os desprestigia – por os tornar ridículos – é precisamente a defesa de algo que surge aos olhos dos outros como inverosímil, absurdo, sem sentido.

Por todas estas razões, a procura da verdade, por parte de pessoas como eu, é quase um trabalho de detective. Quer dizer, observar e ouvir, dando o necessário desconto às apreciações relativas que vamos encontrando pelo caminho, usando a dúvida metódica em permanência. Assim fazendo, procuro ser lúcido em relação aos meus. Sobretudo em relação à família, pois não tenho partido político nem clube de futebol. Por isso sou tão crítico, o que frequentemente os incomoda. Por não querer ser parcial, torno-me, porventura, demasiado exigente, talvez injusto. O que, de certa forma, também é um bocado estúpido.

Mas não é ridículo.

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