É minha intenção divulgar, através deste meio, as minhas ideias a respeito da sociedade em que vivemos, expressas em todos os livros que escrevi, mais ensaísticos ou mais literários - Luis Valente Rosa.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Revolução, rebelião, revolta

No recentemente publicado diário da S. Sontag, Renascer, surge uma reflexão muito interessante que relaciona os conceitos de rebelião e revolução – cada vez me interessa mais a elaboração e reformulação de conceitos, cada vez entendo mais a sua importância, essencial, na filosofia.

Para ela (Sontag), rebelião significa algo de inconsequente, sem resultados práticos, algo que acabou por não se cumprir (especificamente, ela fala da ausência de sucesso). Em contrapartida, a revolução implica sucesso na empreitada, o que significa que se realizou, que se cumpriu, de forma mais ou menos completa, a alteração desejada.

A ideia é interessante, e eu pensei imediatamente no verso do Léo Ferré que me persegue há anos e diz: “ela era bela como a revolta”. Automaticamente, tentei encaixar a revolta entre os outros dois conceitos.

A primeira ideia que me surgiu foi o ser a revolta um conceito infinitamente mais belo: ninguém ousaria dizer num poema: “ela era bela como a rebelião”. Ou “como a revolução”.

Em segundo lugar, achei que a revolta, no âmbito da reflexão da Sontag, se aproximava mais da rebelião. De facto, a revolução apresenta uma estruturação, uma finalização, consequências concretas e duradouras. Enquanto a revolta pode ser totalmente inconsequente.

No entanto, o que considerei mais fecundo foi o facto de ter visto uma oposição entre uma natureza colectiva (nos casos da rebelião e da revolução) e uma natureza individual (no caso da revolta). Pelo que um indivíduo pode revoltar-se sozinho, mas não consegue fazer uma revolução, ou uma rebelião, sem um colectivo.

Seguindo este raciocínio, vi-me conduzido a uma ideia de a revolução ter sempre uma essência de direita (segundo a minha definição do par de conceitos direita e esquerda), uma vez que pretende sempre substituir um todo estruturado (que inclui um princípio unificador a combater) por um outro todo de iguais características (com um princípio unificador alternativo). Por outras palavras, há sempre um colectivismo associado (mais, provavelmente, do que um colectivo) que, assim que lhe for possível, se sobreporá à liberdade individual. No fundo, a revolução não faz mais do que substituir um complexo ideológico-doutrinal por outro. Que, como é novo, tem de se impor. Normalmente, à bruta.

A rebelião passa, seguindo esta ordem de ideias, a ser um conceito ambíguo, cujo entendimento depende das circunstâncias. Por isso menos interessante. Tanto pode ser uma revolução que fracassou antes de o ser, como uma amálgama de revoltas individuais. No primeiro caso, seria mais associado a uma dimensão colectiva. No segundo caso, a uma dimensão mais individual.
                      
Em contrapartida, a revolta pode ser vista como o grande mecanismo de protecção das liberdades e dos direitos fundamentais: “eu não aceito isto” ou “não aceito fazer isto”.

Posso então dizer que a revolta assenta numa atitude de liberdade, que não implica uma qualquer ideia ou lógica de coerência ou de amplitude de objectivos (como é o caso da revolução). Em suma, a revolta fomenta a insubmissão, enquanto a revolução exige uma submissão a uma nova organização política. Pelo que só a revolta é compatível com os valores que defendo.

Ou seja, o Ferré usou o termo mais belo e mais adequado.

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